(ARTIGO) O grito que vem da favela: Ninguém falará por nós!

Há aproximadamente 700 favelas no Rio de Janeiro, são mais de 100 anos de resistência, mais de um século de uma história contada por grandes mudanças, lutas, conquistas e organização. A criminalização da pobreza já existia desde o surgimento da favela, muitas delas passaram pelas remoções, a polícia já perseguia e olhava para as pessoas que habitavam a favela como criminosas, os jornais da época também tratavam o lugar e a população como ‘feio’, ‘invasor’, ‘violento’, ‘sujo’, ‘sem estudos’ etc.

Depoimentos e práticas atuais dos governantes e de toda a sociedade fazem mostrar que tais atitudes e argumentos não mudaram. As favelas continuam sendo criminalizadas, invadidas, alteradas, transformadas por forças vindas de cima para baixo. Atualmente, inúmeras favelas localizadas na cidade do Rio estão há mais de cinco anos sofrendo com grandes transformações em seus espaços, seja com as remoções forçadas, ou com as invasões das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). Sendo estas ações comandadas pelos próprios governantes.

Em 2010, 119 favelas foram parar na lista das remoções para dar lugar às vias expressas e a grandes obras. Metade delas já sumiram do mapa. Aproximadamente 50 favelas estão hoje sofrendo com as UPPs. Tudo isto porque o Rio passou a ser palco dos megaeventos, a Copa do Mundo, que ocorreu em 2014, e a Olimpíada, em 2016.

Diante dos fatos que são históricos, como colocar em debate de que a favela é cidade? Quais os desafios de se defender e entender a identidade favelada quando se tem uma sociedade toda que criminaliza, afasta, mata, extermina este espaço que tem historicamente raça, é o povo negro, indígena e oriundos dos estados do nordeste do país, e que pertence a uma determinada classe? Como argumentar dentro do lugar chamado favela que a cultura favelada deve ser valorizada, permanecida, continuada, praticada, passada de geração para geração?

Toda a cultura da vida favelada é criminalizada: os ensinamentos, a religião, as vestes, a forma de falar, de se comportar, a música, a construção das casas, da vida, do dia a dia. Como praticar a defesa deste local sem o discurso de ódio à outras classes e tendo como base de que este é um lugar comum, comunitário, onde tudo se aprende em comunidade e que tais exemplos devem ser passados para toda a sociedade?

Mas como passar para toda a sociedade esta grandeza de vida comunitária? Como argumentar dentro e fora sobre esta tal vida alternativa que se sustenta há mais de um século com muita resistência diante de tantos problemas internos e preconceitos externos e também internos? Como e por que deve-se mostrar a outras favelas que nós somos comuns, independente da favela em que moramos, já que nossas realidades são iguais? Como argumentar o sentindo da vida comunitária para outros movimentos sociais, que durante anos ignorou a vida favelada?

Essas são perguntas que uma pessoa não é capaz de responder, ou uma dita acadêmica/acadêmico estudioso de favelas ou de outras áreas, nem mesmo grupos podem saber as respostas. Nenhum discurso de ódio também é capaz de dar respostas, as únicas pessoas que têm legitimidade e podem responder essas perguntas são aquelas que nasceram nas favelas e vivem cotidianamente a sua realidade e resistência, sendo elas negras, brancas, indígenas, mulheres ou homens, pois todos são atravessados pela pobreza que é fruto da desigualdade do sistema capitalista.

São respostas que não serão dadas do dia para o outro, são respostas que a própria prática diária vai mostrar. Os fatos históricos mostram que durante anos e anos estes lugares foram e são criminalizados. No entanto, é preciso conhecer a história para dar continuidade a esta grande sobrevivência comunitária. Ou seja, só quem pode responder essas perguntas é a favela, pois ela é o todo de um grande mundo de diversidades que ali nasceram e nascem; cresceram e crescem; resistem e existem.

12436663_1651813608439749_795915896_oDe: Carolina favelada
“Eu denomino que a favela é o quarto de despejo de uma cidade. Nós, os pobres, somos os trastes velhos”, estes são relatos de Carolina Maria de Jesus, ela nasceu em 1914, Minas Gerais. De família pobre, esta mulher negra e favelada passou a vida resistindo, sobrevivendo, criando sozinha os seus filhos. Eu, moradora de uma das maiores favelas do Rio de Janeiro, comunicadora favelada, me identifico com cada frase, livro desta grande mulher negra e favelada chamada Carolina, pois seus escritos são nada menos do que a sua própria realidade. Habitar este espaço chamado favela é sinônimo de muita resistência, cultura, alegria, misturados a grandes desafios por causa da falta de direitos, um deles, o direito à vida. No entanto, é preciso que nós, favelados, coloquemos para além dos muros das favelas, a nossa própria história!

(Relato) Pequena homenagem a Presidente, um homem que escolheu lutar

Um curto vídeo produzido em 2014 por alguns midiativistas cariocas fica como homenagem a Sérgio Luis Santos das Dores, o Presidente.

Presidente, morador de rua e ativista, era figura ativa na Cinelândia, Centro do Rio de Janeiro, por onde morava. Sua partida comoveu companheiros e companheiras de luta, amigos e amigas de rua. Presidente faleceu nessa segunda-feira (14/12), depois de ficar internado por quatro dias com graves problemas de saúde.

Presidente vivia desde 2005 nas ruas próximas à Cinelândia. Sofria com o Mal de Parkinson e com diabetes. Após ter graves problemas no pulmão, esteve internado durante quatro dias na Coordenação Regional de Emergência (CER), do Hospital Souza Aguiar, no Centro do Rio. Na unidade de saúde, ele teve tremores, delírios e um derrame pleural no pulmão, além de septicemia. Faleceu em decorrência de uma falência múltipla dos orgãos e deixou orfãos e orfás de sua companhia uma legião de ativistas que sempre esbarrava com ele nas ruas cariocas, palco das Revoltas de Junho em 2013.

No Souza Aguiar, o Presidente sofreu com o descaso típico dos hospitais públicos brasileiros:

“Ele estava com uma infecção aguda na perna e sofria de Parkinson e diabetes. Quando chegou no CER, diagnosticaram erroneamente com abstinência alcoólica por contra da tremedeira, e injetaram soro com glicose. Em um diabético! Além disso, os documentos dele foram extraviados durante uma troca de quarto. Isso atrasou o atestado de óbito, que ainda foi preenchido errado. Por isso, não conseguimos vaga para sepultar o corpo hoje (terça)”, lamentou uma ativista que o conheceu na Assembleia Popular da Cinelândia, que se reúne mensalmente desde 2013.

Presidente era conhecido por sua espontaneidade e pelo ativismo. Engajado politicamente, estava sempre presente nas ocupações, protestos, manifestações e assembleias populares que tomam o cinza da cidade em um ímpeto combativo cujo intuito é questionar o autoritarismo do Estado e a exploração pelo Capital.

O velório de Presidente ocorreu, simbolicamente, na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, bem no meio do covil dos ratos. Pois dizemos, na Cinelândia, presidente só tem um! O nosso eterno Presidente! Abaixo o presidente fantoche da Câmara!

Após o velório, um cortejo saiu da câmara por volta das 13h30 em direção ao Cemitério do Catumbi sob os gritos de “poder, poder para o povo!”, interditou ruas e derramou lágrimas de eternas saudades desse ser tão vívido, tão combativo.

No fim da tarde, foi, enfim, sepultado. “Presidente eterno!”, lembrava quem estava presente no enterro. Um guerreiro se foi, mas a sua memória ficará guardada para sempre nas lembranças e nos corações de ativistas e militantes cariocas.

“Ele perdeu a mãe e se separou da mulher, e isso foi uma hecatombe para ele. Mesmo assim, em todos os atos, manifestações e passeatas, ele agiu sempre como um cidadão consciente de seus direitos de lutar”, disse um amigo, antigo morador de rua, e que conheceu o Presidente em 2011.

PRESIDENTE, PRESENTE! SAUDADES ETERNAS!

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(Salvador) Campanha financeira do jornal anarquista Café Preto

O Café Preto é um jornal popular sediado na cidade de Salvador-BA que surge da necessidade de noticiar um mundo tornado invisível, um mundo de lutas e resistências. Queremos noticiar os conflitos territoriais, desde as lutas quilombolas até as reivindicações dos trabalhadores nas periferias das cidades. Queremos questionar a história oficial da Bahia, sempre contada a partir de um olhar colonizador, e que insiste em vender a imagem do sempre feliz, satisfeito, e acolhedor povo baiano.

Para mostrar o outro lado da história, repleta de belas lutas e tristes fatos, é que surge o Café Preto, um jornal anarquista, que dialoga e constrói ombro a ombro uma outra perspectiva de comunicação.

Somos um jornal voltado para o público popular, desta forma seria contraditório cobrarmos a sua distribuição.

Até aqui temos colocado em prática a ajuda-mútua e o faça-você-mesmo para tocar nossas atividades, e para mantermos a sustentabilidade financeira do jornal, precisamos de
mais companheiros e companheiras nesta correria.

Diante disto, estamos aqui buscando ampliar nossa rede de cooperação entre aquelas e aqueles que simpatizam com o sabor do Café Preto. Precisamos da sua ajuda para complementar o pagamento dos nossos custos, pois o cobrador já já baterá às nossas portas.

Mas como funciona este jornal?

Como qualquer outro jornal, temos um objetivo maior de existência. Acreditamos que um outro mundo é possível, um mundo diverso e repleto de solidariedade, de apoio-mútuo, autonomia, horizontalidade e liberdade.

Funcionamos de forma autogestionária, sem hierarquias e extremamente organizada, onde todos exercem a democracia de forma direta, livre e solidária, desde a seleção das pautas, passando pela redação das matérias, a elaboração de fotografias e até a confecção de vídeos e a diagramação das versões impressas e online do jornal.

Buscamos utilizcafé pretoar uma linguagem popular e simples, abordando temas de extrema complexidade e do interesse da população baiana, sem perder a profundidade necessária para instigar uma análise crítica dos fatos apresentados. Tentamos dar visibilidade às lutas ocultas que a grande mídia corporativa jamais terá interesse em noticiar. Priorizamos a distribuição nas ruas, nos meios populares, nas periferias urbanas, nas comunidades rurais, mas também não esquecemos o nosso público antenado no meio digital. Dessa forma, além do nosso Jornal impresso, auto-gerimos uma página oficial, uma página de facebook e um canal no youtube.

Quais são os custos de produção?

Muitos! Até agora, alguns dos nossos custos principais são::

Custo por edição

  • Toner (recarga): R$ 250,00
  • Manutenção (Peças, mão-de-obra…): R$ 250,00
  • Papel para impressão: R$ 100,00
  • Operacional (transporte, alimentação…): R$ 150,00

TOTAL: R$ 750,00

Investimentos iniciais

  • Impressora: R$ 3.153,86

Investimentos futuros

  • Toldo (Distribuição do Jornal nas ruas, realização de eventos…): R$ 139,00
  • Câmera Digital: R$900
  • Tripé: R$100
  • Microfone Gravador: R$300
  • Sede?? =D

Como posso ajudar?

Como você viu, nossos custos são bem altos, então você pode nos ajudar fazendo uma doação mensal no valor que couber no seu bolso! Veja abaixo um passo a passo de como fazer isso:

Caso você não tenha um telefone fixo ou celular, pode colocar um número aleatório para completar o cadastro. O mesmo vale para o caso de você ter dificuldade de preencher qualquer um dos demais campos obrigatórios de cadastro.

Se a situação estiver difícil e não puder contribuir, tudo bem, você pode ajudar na divulgação do Jornal, nos ajudando com materiais (textos, imagens, vídeos) e, até mesmo, fazendo parte da construção desse cafezinho. O Café Preto agradece e fortalece!

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(POESIA) Todo o mapa mundi colorido de sangue

Ninguém fala nada
Se é em Fortaleza a chacina
Ou se foi em Minas que a lama na vida dos pobres virou rotina
Aí a quantidade de mortos não deixa a maioria das pessoas indignada.

Quase não se fala dos que agora estão na miséria,
Assim como parece não importar o que acontece com meninas (-bomba) na Nigéria.

As cores azul, branco e vermelho colorem a foto do perfil
Enquanto a PM colore de vermelho as ruas das periferias do Brasil.

Todo o mapa mundi colorido de sangue
Mas não é todo tipo de sangue que comove a maioria
O dono do sangue por quem todos têm empatia não é preto
Pobre
Ou da periferia.

E a nossa desgraça? “Não tem graça”.
Não vai passar na TV,
Não vai comover,
Não vai vender.

A maioria só se comove com tragédia importada
Da França!
(Très chic!)
Se não é nos EUA ou na Europa
Ninguém
Fala
Nada.

Ocupações em escolas que serão fechadas?
Crianças negligenciadas?
Mais dores abafadas.
Mais pessoas periféricas silenciadas
Pelo cassetete,
Pela (P)i(M)enta nos olhos
E pelos que não aguentam ver comoção direcionada e empatia seletiva serem problematizadas.

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De: L.S

(POESIA) Meu nada querido amigo secreto

Não teve décadas de diferença que te interrompesse
Não teve peso na consciência
Não teve quem te fizesse pagar.

Desde então não tem banho que me limpe
Não tem tranca que me proteja
Não tem choro que me descarregue
Não tem abraço que me roube a angústia.

Não tem grito que me esvazie
Não tem remédio que me cure
Não tem cola que me restaure
Não tem piada sobre que não me machuque.

Não tem terapia que me faça esquecer
Não tem “vidrinhos de paz” pro psiquiatra me prescrever
Não tem anestésico pra essa dor
Não tem sonhos que afastem esse pesadelo ou o horror.

Não tem borracha que apague
Não tem ano novo que renove minha memória
Não tem fogo que queime a lembrança
Não tem faca que corte esse pedaço da minha existência
Não tem vento que traga de volta minha inocência.

Não tem passo a frente que me faça superar
Não tem como lembrar sem querer vomitar
Não tem tempo que faça passar.

Não tem filme que me fortaleça
Não tem música que me devolva a calma
Não tem nada que faça com que eu esqueça
Não tem poema que me limpe a alma.

Então NÃO TEM reclamação, crítica ou choro que me faça parar de lutar para que isso nunca mais aconteça.
Com nenhuma mulher.
Não vem com essa,
Nenhuma de nós quer.

Não tem “Bolsomito” que me faça pensar que estou enganada
Eu não mereci
E ne-nhu-ma de nós merece ser violentada.

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De: L.S