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(Artigo) Ser mulher favelada é resistir dia a dia!

claudia

São os muros que nos cercam, são os tiros que atingem os nossos filhos, são as nossas casas que nos são tiradas dia a dia, somos arrastadas pela polícia. Ser mulher e favelada é lutar e resistir diariamente a uma vida que nos obrigaram a ter só por causa do espaço que nascemos, moramos e da cor que esta maioria tem.

Ser mulher e favelada é ser obrigada a lutar diariamente porque a escolha de ficarmos caladas, esta nunca foi nos dada, já nascemos para gritar, nascemos literalmente gritando contra esta sociedade desigual! Descer o morro, andar pelas ruas da favela, resistir às upps, aos tanques guerra, a falta de saneamento e calçadas que não existem, já é uma enorme resistência.

Chegando ao asfalto ou ligando a TV temos mais lutas, pois o que a gente vê são inúmeros estereótipos sobre nós. Infelizmente, até alguns dos nossos e nossas repetem, mas a culpa não é nossa. Afinal, é um trabalho diário e massivo para que a gente se sinta: fraca, feia, burra, preguiçosa, sem cultura, sem nome e sobrenome e que a gente aceite ainda o tapa na cara, para que a gente aceite também a opressão do homem sobre os nossos corpos. Sim, a mídia ajuda muito nisso.

A gente entende bem o que é isso, nada mais são do que preconceitos, machismo e racismo estabelecidos nesta sociedade do capital feito para que a gente se sinta menor, inferior, triste, sem vida, sem nada, um nada, ferida, calada, culpada. Entendemos ainda que todos os dias é dia de dizermos que temos que virar o jogo, virar a mesa mesmo, continuar gritando e dizendo que temos nome sobrenome e moramos na favela.

Gritamos contra todas essas formas de opressões há mais de cem anos, desde que favela é favela. Lembre que a gente nunca dormiu no ponto, não temos esta escolha, não dá, não podemos, não temos tempo. Saiba ainda que, nós mulheres faveladas, temos cultura, vida, lugar de fala e não precisamos da opinião desta sociedade que nos mata diariamente e até silenciosamente.

Nossos direitos dentro dos nossos espaços favelados são mínimos, já sabemos disso, e o que temos dentro dele, tudo o que temos foi construído por nossas próprias mãos e a gente se orgulha e muito disso!

Viva a luta e resistência da mulher favelada, esta que constrói cada pedaço desta cidade e com as nossas próprias mãos! Somos parte da cidade! Somos favela! Somos faveladas!

Por Carolina Favelada

(Relato) Nota sobre a primeira edição do OcupaRap

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No dia 06/03, o coletivo favelada de maioria negra Ocupa Alemão realizou sua primeira edição do OcupaRap. A atividade é mais uma das  diversas atividades que o coletivo realiza no Complexo do Alemão, conjunto de favela localizadas na Zona Norte do Rio de Janeiro.

Além de várias apresentações de grupos de Rap locais e de outras favela, o evento também contou com a participação do grupo de apoio e pela liberdade de Rafael Braga, que falou sobre o processo e receberam doações de alimento para a família de Rafael. Vale lembrar que o coletivo Ocupa Alemão dá também um grande e importante apoio para as familiares de Rafael Braga, que moram no Complexo do Alemão, recebendo sempre donativos para ele e para sua família.

O evento aconteceu durante toda a tarde e começo da noite e contou com um fluxo grande de pessoas, tanto da favela quanto de outros locais. Além da campanha contra a prisão de Rafael, o evento teve várias falam contra o genocídio da população negra e também a estreia no Rio de Janeiro do jornal da campanha Reaja ou Será Morta/Morto, intitulado ASSATA SHAKUR!

PELA LIBERDADE DE RAFAEL BRAGA VIEIRA!

PELO VIM A PERSEGUIÇÃO À ASSATA SHAKUR

PELO FIM DO GENOCÍDIO DO POVO NEGRO!

(Rio de Janeiro) Apoio Urgente para a Vila Autódromo

ALERTA GERAL!

Hoje, a prefeitura do Rio de Janeiro mostrou que não está brincando ao preparar a cidade para as Olimpíadas.

Utilizou contra nós todo tipo de violência, desrespeito. Agiu com imensa covardia. Ela está tentando nos sufocar de todas as formas. Conseguiu imissões na posse para três imóveis e espalhou o terror dizendo que os cumpriria todos de uma vez. Pressão, pressão, pressão. Por todos os lados.

Agora, mais do que nunca, precisamos de TODOS os nossos apoiadores! Quem puder vir HOJE para cá, será importante e necessário! Acionem suas redes e contatos. Toda solidariedade agora é necessária.

Nós vamos ficar!
A prefeitura não vai nos silenciar!
Chega de violação dos nossos direitos!

Por Moradoras/es da Vila Autódromo

(ARTIGO) O grito que vem da favela: Ninguém falará por nós!

Há aproximadamente 700 favelas no Rio de Janeiro, são mais de 100 anos de resistência, mais de um século de uma história contada por grandes mudanças, lutas, conquistas e organização. A criminalização da pobreza já existia desde o surgimento da favela, muitas delas passaram pelas remoções, a polícia já perseguia e olhava para as pessoas que habitavam a favela como criminosas, os jornais da época também tratavam o lugar e a população como ‘feio’, ‘invasor’, ‘violento’, ‘sujo’, ‘sem estudos’ etc.

Depoimentos e práticas atuais dos governantes e de toda a sociedade fazem mostrar que tais atitudes e argumentos não mudaram. As favelas continuam sendo criminalizadas, invadidas, alteradas, transformadas por forças vindas de cima para baixo. Atualmente, inúmeras favelas localizadas na cidade do Rio estão há mais de cinco anos sofrendo com grandes transformações em seus espaços, seja com as remoções forçadas, ou com as invasões das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). Sendo estas ações comandadas pelos próprios governantes.

Em 2010, 119 favelas foram parar na lista das remoções para dar lugar às vias expressas e a grandes obras. Metade delas já sumiram do mapa. Aproximadamente 50 favelas estão hoje sofrendo com as UPPs. Tudo isto porque o Rio passou a ser palco dos megaeventos, a Copa do Mundo, que ocorreu em 2014, e a Olimpíada, em 2016.

Diante dos fatos que são históricos, como colocar em debate de que a favela é cidade? Quais os desafios de se defender e entender a identidade favelada quando se tem uma sociedade toda que criminaliza, afasta, mata, extermina este espaço que tem historicamente raça, é o povo negro, indígena e oriundos dos estados do nordeste do país, e que pertence a uma determinada classe? Como argumentar dentro do lugar chamado favela que a cultura favelada deve ser valorizada, permanecida, continuada, praticada, passada de geração para geração?

Toda a cultura da vida favelada é criminalizada: os ensinamentos, a religião, as vestes, a forma de falar, de se comportar, a música, a construção das casas, da vida, do dia a dia. Como praticar a defesa deste local sem o discurso de ódio à outras classes e tendo como base de que este é um lugar comum, comunitário, onde tudo se aprende em comunidade e que tais exemplos devem ser passados para toda a sociedade?

Mas como passar para toda a sociedade esta grandeza de vida comunitária? Como argumentar dentro e fora sobre esta tal vida alternativa que se sustenta há mais de um século com muita resistência diante de tantos problemas internos e preconceitos externos e também internos? Como e por que deve-se mostrar a outras favelas que nós somos comuns, independente da favela em que moramos, já que nossas realidades são iguais? Como argumentar o sentindo da vida comunitária para outros movimentos sociais, que durante anos ignorou a vida favelada?

Essas são perguntas que uma pessoa não é capaz de responder, ou uma dita acadêmica/acadêmico estudioso de favelas ou de outras áreas, nem mesmo grupos podem saber as respostas. Nenhum discurso de ódio também é capaz de dar respostas, as únicas pessoas que têm legitimidade e podem responder essas perguntas são aquelas que nasceram nas favelas e vivem cotidianamente a sua realidade e resistência, sendo elas negras, brancas, indígenas, mulheres ou homens, pois todos são atravessados pela pobreza que é fruto da desigualdade do sistema capitalista.

São respostas que não serão dadas do dia para o outro, são respostas que a própria prática diária vai mostrar. Os fatos históricos mostram que durante anos e anos estes lugares foram e são criminalizados. No entanto, é preciso conhecer a história para dar continuidade a esta grande sobrevivência comunitária. Ou seja, só quem pode responder essas perguntas é a favela, pois ela é o todo de um grande mundo de diversidades que ali nasceram e nascem; cresceram e crescem; resistem e existem.

12436663_1651813608439749_795915896_oDe: Carolina favelada
“Eu denomino que a favela é o quarto de despejo de uma cidade. Nós, os pobres, somos os trastes velhos”, estes são relatos de Carolina Maria de Jesus, ela nasceu em 1914, Minas Gerais. De família pobre, esta mulher negra e favelada passou a vida resistindo, sobrevivendo, criando sozinha os seus filhos. Eu, moradora de uma das maiores favelas do Rio de Janeiro, comunicadora favelada, me identifico com cada frase, livro desta grande mulher negra e favelada chamada Carolina, pois seus escritos são nada menos do que a sua própria realidade. Habitar este espaço chamado favela é sinônimo de muita resistência, cultura, alegria, misturados a grandes desafios por causa da falta de direitos, um deles, o direito à vida. No entanto, é preciso que nós, favelados, coloquemos para além dos muros das favelas, a nossa própria história!