(Rio de Janeiro) Denúncia de agressão à mulher no bar Os Ximenes, Lapa

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“Anarcofeminismo vê o patriarcado como uma hierarquia involuntária e que a luta contra ele é parte essencial da luta de classes e da luta contra o Estado. O movimento vê o anarquismo como parte da luta feminista e vice-versa. Em outras palavras, se o anarquismo se opõe a todas as relações de poder então ele é inerentemente feminista.”

Era entre 7h e 8h da manhã de Domingo, dia 28 de Junho de 2015. Eu passei a noite trabalhando e depois fui beber com amigas pela Lapa. Decidi usar algum banheiro antes de ir embora, e como já havia consumido no bar “Os Ximenes” mais cedo, decidi utilizar o banheiro de lá. Quando me aproximei do estabelecimento, percebi que apesar do salão vazio e a ausência de funcionários, o balcão ao lado estava atendendo. Como não vi ninguém no salão e estava muito apertada fui direto pro banheiro. 

Assim que sai do banheiro dei de cara com um homem de cerca de 1,70m, com traços nordestinos e forte. Ele usava calça jeans, camisa branca com uma estampa e um boné pra frente. Obviamente esse homem era um funcionário do bar. Imediatamente ele me abordou me xingando. Me chamando de puta, perguntou se eu não tinha visto que o banheiro estava fechado e era cobrado. Automaticamente respondi xingando de volta. O homem então agarrou um dos meus braços e continuou a agressão verbal. A essa altura ele já estava me machucando e eis a informação que não pretendo sonegar: eu reagi. Reagi como mulher cansada dos estupros, dos assédios e das agressões que já sofreu. Reagi por saber que a polícia é um braço armado do patriarcado e jamais me protegeria. Reagi porque o feminicídio praticado diariamente destruiu minha psique. Reagi pelas irmãs negras e periféricas que não tem pra onde fugir. Reagi por não suportar mais ser silenciada, ameaçada e ridicularizada. Reagi por ser sempre culpabilizada pela violência que sofro. Reagi porque nada deve parecer natural.

Então o homem me socou o rosto. Por sorte e pela minha resistência física não cai. Nesse momento, após ter bebido e sido agredida, fiquei completamente desorientada. Comecei a gritar desesperadamente. Dois outros funcionários do bar se aproximaram e me imobilizaram para que o espancamento continuasse. E continuou. Consegui me soltar e a única coisa que consegui pensar foi em quebrar coisas para chamar a atenção de quem passava pela rua. Lembro que nesse momento não havia ninguém dentro do bar e eu só pensava que eles provavelmente me estuprariam e/ou me matariam ali dentro. Enquanto quebrava alguns vidros os funcionários continuavam a me bater.

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A atenção que consegui chamar foi da polícia, logo apareceram Guardas Municipais. Os funcionários gritavam que eu era maluca e tinha entrado ali quebrando todo o bar. E os guardas, obviamente, acreditaram na versão dos homens e me imobilizaram, me dando voz de prisão logo em seguida. Numa brecha consegui sair de dentro do bar, sendo novamente alcançada e sendo agredida dessa vez pelos guardas. Sabendo que meus amigos estavam na próxima esquina lutei com pelo menos 6 GMs e 3 funcionários do bar até chegar lá. Quando finalmente cheguei a esquina, fui jogada na parede e levei um “mata leão” de um dos funcionários. Os guardas pareciam estar se divertindo com a cena. Juntei minhas forças e gritei pelos meus amigos. Cerca de 10 pessoas vieram até o local e se manifestaram a meu favor. No meio da confusão fui puxada por um amiga e consegui escapar. Nossa reação foi correr desesperadamente pra longe dali, eu precisava de atendimento médico e sabia o que eles eram capazes de fazer comigo enquanto supostamente me conduziriam pra delegacia.

O bar “Os Ximenes” fica na Rua Joaquim Silva, 82 – Lapa. Aquele bar que fica bem em frente a escadaria Selarón.

Levei mais de uma semana pra conseguir fazer esse relato. Eu não tinha forças psicológicas para detalhar o que aconteceu, o fiz sem ainda ter. Além do rosto bastante ferido, fiquei com hematomas pelo corpo, um dedo torcido e parte da garganta machucada a ponto de ter quebrado um pedaço do meu dente.

Decidi denunciar publicamente o ocorrido principalmente como forma de alertar as mulheres que frequentam o local. Mais que isso, para também deixar um recado: nós mulheres precisamos nos organizar para combater o machismo. A reação e a autodefesa são e sempre serão legítimas. Mas o ódio e a depressão que nos tomam podem ser substituídos por acolhimento e luta. Nossa maior arma contra a violência é a nossa sobrevivência, nossas vidas, o nosso grito, a nossa união, nossos corpos livres.

Sociedade, por que nos culpam pela opressão que sofremos? Por que nos separam e diferenciam para que fiquemos umas contra as outras? Por que justificam absurdamente as brutalidades que praticam contra nós por fazer coisas “normais” que qualquer ser tem direito? Temos direito ao lazer. Temos direito ao sexo. Temos direito à liberdade de expressão. Temos direto à nossos corpos. Temos direito à vida.

É conclusivo que a principal ação para exterminar o peso esmagador do patriarcado é a prática da educação livre. Precisamos investir esforços na conscientização das crianças para impedir que esses meninos cresçam misóginos (ódio pelas mulheres). Precisamos esclarecer aos jovens que o assédio começa com as cantadas de rua, passa pela dominação psicológica, emocional e financeira com suas companheiras e culmina em estupros e assassinatos. Não há nada de carinhoso e amoroso no sofrimento de uma mulher. NÓS NÃO GOSTAMOS DE CAFAJESTES! E mais: nós nem sempre gostamos de nos envolver com homens. E deixo aqui um alerta ainda maior sobre o genocídio das mulheres bi/lesbo/transsexuais.

Não reprimam as meninas, ensinem os meninos a não estuprar.

Deixo por fim um gigantesco agradecimento a todas e todos que me apoiaram nesse momento difícil, inclusive ajudando com remédios.

Irmãs de todo o mundo: empoderem-se de sua identidade, não se depreciem! Lutem, resistam e não deixem de sorrir e dançar! “

“A ignorância é o elemento mais violento da sociedade.”

“Não passamos de átomos no incessante esforço humano em direção à luz que brilha na escuridão: o ideal de liberação econômica, política e espiritual da humanidade!” – E. G.

A. 09/07/15