Tag Archives: Feminismo

(Curdistão) Convocatória Internacional: Convite do KJA à participação no 8 de Março, Dia Internacional da Luta das Mulheres

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Estimadas mulheres do mundo:

O grande legado herdado do movimento mundial das mulheres, de luta pela liberdade da mulher no Curdistão, construído através de grandes sacrifícios, continua avançando contra a mentalidade dominada pelos homens nos últimos 40 anos. Fazemos um chamado a todas as mulheres do mundo para que se unam a nós de forma solidária e para que nos ergamos na luta comum este 8 de Março, o Dia da Resistência e da Luta das Mulheres.
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(Artigo) Do transplante ao aborto: a coragem de fazer nascer a morte e a vida

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Foto de Kati Horna

Lá no seu íntimo, você sabe que abortar não é legal. Bem ali no seu íntimo, você sente que ser mãe é natural, é o seu destino ou o destino dela, e você ama o destino. No fundo do teu peito, mora um músculo que se aperta ao pensar na cena: pernas abertas e algum sangue a escorrer. Abortar é quebrar um contrato com Deus, é ter o diabo como advogado e um homem com poder de juiz. Seu íntimo ainda cochicha sobre a irresponsabilidade dela, que não se cuidou, que não pensou duas vezes. Ele se divide entre condenar por ignorância quem não se informou e tomou o remédio errado, por burrice quem confiou demais nos métodos contraceptivos, por vadiagem a quem se rende ao tesão descuidado, de merecedora que provocou com a saia encurtada. Toda vida é uma dádiva. E toda vida perdida é uma dívida.

Nosso íntimo é um ser em eterna gestação. Grávido dos valores e das certezas que encafifamos pelo caminho. Gosto da palavra encafifar. Aos meus ouvidos, ela chega como uma ilustração dessa coisa que é ser fruto das ideias que o mundo dá pra gente, mas do jeito que a gente mesmo consegue processá-las. O seu íntimo, o meu íntimo, é o fruto desse movimento. E desde de que seu íntimo é íntimo, que te mostram fotografias de outros fetos, semelhantes fisicamente ao bicho gente, dizendo que abortar é matar um ser pronto, um ser feito, um ser vivo. Antes de você saber que tinha ideias, já as colocavam dentro de você. E não consigo pensar em nada mais natural do que isso, além da própria possibilidade de refazer essas ideias, rever aquilo que eu quero em mim e o que eu não quero.

Hoje você (e o seu íntimo) é a favor do transplante. Na verdade, transplante é uma coisa que você nem pensa ser contra ou a favor. Transplante é uma necessidade que se apresenta, uma demanda da vida, uma política a ser melhorada, um objeto de estudo, mas não é algo a ser contra ou a favor. Só que nem sempre o transplante foi natural. Criaram a técnica, treinaram e aprimoraram as ferramentas, mas faltava decretar a morte, a ausência da vida. Era necessária uma legislação (apoio e adesão popular também, claro) que determinasse quando um coração poderia ser retirado de um corpo, sem que o matasse. Nesse momento, nasce a morte. Dar a luz à morte, exigiu a matança de muitos íntimos, tão justos e tão certos quantos esses nossos, para fazer viver outros seres, tão cheios de íntimo quanto nós. O que fizemos, humanidade, foi estabelecer que o corpo morre quando tais funções acabam, ainda que outras estejam muito bem obrigada. Legalizar o transplante de órgãos foi determinar onde a vida acaba. Legalizar o aborto será determinar quando a vida começa.

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(Entrevista) Angela Davis sobre racismo, feminismo e Beyoncé

Entrevista com Angela Davis feita por Alice Harrold e Olivia BlairTexto. Publicado originalmente com o título: ‘Angela Davis on racismo, feminism and Beyoncé’ no site do jornal eastlondonlines.co.uk em 02/12/2014. Tradução de Liliane Gusmão e Patrícia Guedes para as Blogueiras Feministas.

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Líder acadêmica radical e feminista, Professora Angela Davis, visitou Goldsmiths, e que obteve um grau honorário, na semana passada para renomeação de um edifício em honra do falecido Stuart Hall. Ela falou com Alice Harrold e Olivia Blair.

Angela Davis teve uma longa jornada desde sua infância de forma segregada em Birmingham, Alabama, passou um período nos “10 mais procurados do FBI”, para se tornar um dos ícones do movimentos de direitos civis e uma respeitada acadêmica e autora.

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(Comunicado) Nota Pública sobre a violência policial ocorrida durante a 1ª Feira do Livro Feminista e Autônoma de Porto Alegre

Somos um coletivo de pessoas que se formou através de afetos, amizades, afinidades e momentos e vivências antes, durante e depois da I Feira do Livro Feminista e Autônoma de Porto Alegre (I FLIFEA POA). A feira tinha como seu principal objetivo a troca de materiais, de vivências e de experiências que pudessem debater coletivamente a respeito dos feminismos e da autonomia das mulheres frente às instituições e em relação a seus corpos. Esse objetivo estava se concretizando ao longo de dois dias de atividades, nos quais nos fortalecemos entre todas, conversamos, aprendemos, rimos e novas ideias puderam surgir a partir do encontro. Até que, juntas, muitas de nós sofreram a violência policial da noite de primeiro de novembro de 2015. Entre as agredidas estavam presentes algumas das que compunham a organização da FLIFEA, mas não só. A partir dos últimos acontecimentos vivemos uma nova forma de autogestão da experiência compartilhada onde “a organização da feira” se dissolve na nova coletividade que escreve este texto, composta por aquelas que foram diretamente afetadas pela repressão vivida na noite de domingo.

Dito isso, nos manifestamos através desta nota pública no blog da I FLIFEA POA, da maneira combinada entre nós como única manifestação pública do grupo mencionado acima. De acordo com isso, nenhuma de nós concedeu e nem concederá entrevista a qualquer veículo de comunicação e, embora estejamos recebendo assistência jurídica de advogadas feministas de maneira voluntária, elas também não nos representam frente à mídia. Também é importante apontar que não organizamos ou marchamos sozinhas no ato do dia dois de novembro de 2015, mas contamos com o apoio espontâneo de muitas pessoas que se sensibilizaram com nossa situação, e não tivemos relação alguma com o ato do dia seguinte, dia três de novembro de 2015. Nos fortalece muito e agradecemos o apoio das pessoas e organizações que estão se mobilizando autonomamente em relação ao ocorrido e nos comove a grande rede de solidariedade criada; no entanto, nos parece importante estabelecer que essa rede extrapola nossa dimensão organizativa e, portanto, não é possível nos responsabilizar pela totalidade dos eventos disparados pelo episódio. A quem resiste em solidariedade conosco, pedimos cuidado para não falarem em nosso nome, e, ainda, pedimos o respeito para não fazer o uso desse fato para apropriação em relação a agendas políticas partidárias, tampouco individuais.

Entendemos que a situação de agressão policial pela qual passamos se insere num contexto social de mobilização frente aos retrocessos que têm acontecido nas políticas para mulheres e ao crescimento do conservadorismo patriarcal no debate público sobre os direitos já conquistados e ainda por conquistar por mulheres e outros grupos minoritários. Tanto nos debates de políticas institucionais, quanto nos espaços de formação de opinião como redes sociais, diversas pautas feministas estão sendo mobilizadas neste momento, como os assédios cotidianos que vivemos desde a infância , nossa autonomia para decidir sobre nossos corpos, a violência vivida em espaços domésticos e a possibilidade de que as mulheres falem por si mesmas. Ao mesmo tempo, percebemos que a repressão que vivemos no último domingo gera comoção por diferentes motivos, que queremos apontar. Primeiro, a brutal violência por parte de policiais, homens, exercida contra mulheres, fazendo uso abusivo de autoridade através de aparatos de força (cacetetes foram usados e armas foram apontadas contra nossos corpos desarmados), evidencia a lógica militarizada e misógina que pauta a atuação dessa corporação. O ocorrido conosco também contribuiu para o reconhecimento das violências cotidianas que as mulheres sofrem, mobilizando aquelas pessoas que já trabalham para combater as causas dessas violências, e também sensibilizando aquelas que vivem ou já viveram essa realidade em suas vidas. Finalmente, consideramos que também foi notável o fato de estarmos nos propondo a construir um debate sobre feminismos num evento cultural no qual nossa arma era a construção de ideias políticas e de cumplicidade, e desse processo ter sido brutalmente atropeladas pela agressão policial.

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(Texto) O Grito de Socorro da Mulher Favelada

Ser mulher favelada

Aproveito esse espaço para falar da mulher favelada, desta que serve e faz a cidade funcionar todos os dias. É esta mulher favelada que muitas das vezes não tem nome, nem sobrenome e não mora em lugar nenhum. Hoje, ela está aqui exigindo o seu direito de ser mulher, de que alguém ouça o seu grito de socorro!

Tal mulher é, em sua maioria, nordestina, negra, indígena, é parte deste povo que está morrendo dia a dia. Digo, dia a dia, porque é sua casa que há mais de cem anos é removida nesta cidade maravilhosa, é o seu filho que há um século está sendo assassinado por causa da criminalização da pobreza. É ela, os seus filhos e seus familiares que não têm e nunca tiveram o direito de estudar, de ter o direito à saúde, ao trabalho digno e até o direito de circular a cidade, a não ser que seja para trabalhar.

Pelo motivo desta mulher morar na favela, ela nem é vista como mulher, como cidadã, ela é apenas “fábrica de produzir marginal”, como disse o ex-governador Sergio Cabral em uma entrevista. A cultura desta mulher, a identidade, a forma dela falar e até as suas roupas são consideradas feias, erradas, são desvalorizadas por toda a sociedade.

Imaginem o que é não ser considerada parte desta cidade apenas por morar na favela? Ter que se defender todos os dias quando você atravessa os muros visíveis e invisíveis da favela? Ter que dizer que você tem cultura sim, que você é parte da cidade e não margem, que você e toda a sua ‘comunidade’ não é criminosa e sim criminalizada, que você e todos os que fazem parte desta tão grande família favelada não é violenta e sim violentada há mais de cem anos.

Lembrando que esta mulher existe! No entanto, ela deve ser ouvida, não mais lavar sangue de seus filhos, não mais chorar e se preocupar com seus filhos a cada vez que a sua favela é invadida por caveirões. Ela merece que o seu filho tenha uma educação de qualidade, ela deve ter um atendimento digno em um hospital público, ela deve ser respeitada na rua, no trabalho, no ônibus, no metrô, em qualquer espaço.

É 2015 e ainda lutamos por direitos básicas porque muitas de nós estão morrendo, sendo violentadas, espancadas, assassinadas apenas pelo fato de sermos mulheres. O Machismo mata, ele sempre matou. É, por isso, que nós mulheres temos que exigir o nosso espaço em qualquer parte da cidade. Tirar o lugar do homem que sempre nos calou, que sempre matou suas companheiras, que não respeita quando a mulher anda na rua, que não ouve quando ela quer gritar e exigir o que é seu!

Esta mulher favelada e todas as outras mulheres vão seguir falando, escrevendo, gritando e exigindo cada dia o seu direito de existir, de andar, de circular a cidade, de viver!

Nós somos parte da cidade, nós existimos!

Por Gizele Martins, jornalista, moradora e comunicadora do Conjunto de Favelas da Maré.

Originalmente publicado aqui.

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