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(TEXTO) Depressão: Da perseguição do Estado ao peso da militância no ativismo.

O que poderia combater a ansiedade? Teremos nós que brigar com guardas de segurança, companhias de seguros, comunidades religiosas e antidepressivos em seu próprio jogo, fazendo de alguma maneira as pessoas se sentirem salvas em um mundo hostil e perigoso? Tentar aliviar a ansiedade ao invés de abolir as condições que a criam certamente seria um fracasso. Devemos aceitar o cenário de pior dos casos como uma conclusão precipitada e correr de encontro para ela, transformando nossa ansiedade em uma arma? Se a ansiedade é a guardiã onipresente da ordem atual, ela também pode ser um perfeito ponto de partida para a resistência – mas isto não responde como xs já imobilizadxs por ela poderiam realizar tal alquimia.

Durante períodos de mobilização e mudanças sociais significativas, as pessoas se sentem mais empoderadas, com maior habilidade de se expressarem, com um senso de autenticidade e conhecimento ou desalienação que podem ser tratamentos efetivos para a depressão e outros problemas psicológicos – como uma experiência de pico. Isso é o que sustenta o ativismo político?

Podemos focar aqui dois aspectos bem comuns relacionados que, em muitos casos, acarretam um alto grau de tensão e problemáticas como a depressão e outras questões sentidas por indivíduos na sua militância devido a inúmeros fatores da perseguição do Estado.

Esses dois aspectos são: Processos de Prevenção e Punição por Antecedência.

Táticas de prevenção são aquelas que impedem os protestos antes que eles comecem ou consigam qualquer sucesso. Prisões em massa, enquadros, prisões “preventivas” de ativistas e buscas e apreensões em residências são alguns exemplos desses tipos de táticas; táticas essas usadas recentemente nos protestos contra a Copa do Mundo no Brasil em 2014 onde inúmeros militantes foram presxs, tiveram suas casas invadidas pela Polícia, suas comunicações grampeadas e toda a sua vida, de seus familiares e amigxs vigiadas pelo Estado.

As punições por processos recorrentes procuram manter as pessoas em situação de pânico, medo e vulnerabilidade através de processos concebidos para outros fins – como manter pessoas em estado de vigilância e investigação ou aguardando julgamentos -, afetando assim toda a atividade cotidiana do indivíduo; usar de restrições de mobilidade, como a impossibilidade de viajar para fora do país ou sempre ser chamado para supostas investigações; uso de recorrentes averiguações e invasões; exposição extrema na mídia, reportagens feitas em casos mal definidos e matérias recorrentes a nível nacional e depois “esquecidas”, apenas pela exposição nos meios; prisões de pessoas envolvidas em ativismo; detenções ou chamados pela justiça para “averiguações”; deixar as pessoas em um estado que saibam que estão silenciosamente sob vigilância, entre outros. Uma vez que o medo de interferência do Estado é imposto, ele é forçado pela rede de vigilância visível gradeada ao longo da vida pública, o que funciona como gatilhos de trauma e ansiedade estrategicamente implantados.

Relatos pouco expostos mostram histórias dramáticas sobre os efeitos de tais táticas: pessoas tendo colapsos nervosos após anos esperando por julgamentos que elas são depois absolvidas, casos de suicídio após a pessoa passar meses sem contato com a família e amigxs, casos comuns de pânico e receio de sair depois de incidentes de abuso, síndromes de perseguição, etc.

Os efeitos são tão reais como se o Estado estivesse matando ou dando fim nas pessoas, mas estes “serviços” acontecem ocultamente. Além disso, muitos ativistas radicais estão em regimes de empregos precários ou em exclusão e em regimes de serviços punitivos.

E esse ponto da saúde mental e psicológica do militante de diversas frentes tem que ser discutido, devemos bolar maneiras e métodos coletivos para a auto-ajuda-mutua. O indivíduo antes, durante e depois das perseguições do Estado não deve ser abandonado ou esquecido, o problema não é apenas dele e sim de todxs nós.

Se nós não criarmos métodos ou formas de nos ajudarmos em momentos difíceis, depressão, tristeza, problemas familiares, perseguições e etc estaremos fadados a cair pelo peso que a militância trás consigo. Criar vínculos de amizade e apóio mútuo reforçando laços de amor, carinho, momentos de descontração e afins são formas e saídas de prevenção.

Para quem não conhece segue a carta escrita pelo ambientalista, o canadense Richard Gomberg – Tooker, que veio a se suicidar em 2004 e travava uma luta contra a depressão. Angela Bischoff, sua companheira, justifica a publicação desta carta com a esperança de que a mesma seja uma mensagem importante de Tooker para todas as pessoas que se veem como ativistas para um mundo melhor.

“Caro Ativista,

É mais um dia estranho para mim. As coisas têm sido muito estranhas nos últimos oito meses ou mais. Eu costumava ser um ativista. Agora eu não sei bem o que eu sou…

Minha mente parece enevoada. Eu não consigo pensar muito claramente. Até para fazer um simples sanduíche leva um longo tempo. Tenho que me concentrar em cada passo e me movo muito lenta e deliberadamente. Sinto-me atordoado e desconectado boa parte do tempo. Hoje é o Dia da Terra, mas eu me sinto como se estivesse em outro planeta.

Eu tenho passado parte considerável de tempo na cama, dormindo, cochilando e sonhando. Parece que a minha mente se derreteu. Disseram-me que ela voltará ao normal quando passar a depressão. Seja lá o que for isso. Dizem que para algumas pessoas [sair da depressão] leva meses; para outros anos; outros, dizem, nunca conseguem sair dela.

Mas eu estou escrevendo para você sobre ativismo, não sobre os impactos assustadores de depressão.

Amory Lovins, o guru grande da eficiência energética [nos EUA], uma vez que me chamou de hyper-ativista. Eu acho que é o que eu era. Eu vivia, respirava e estava focado sempre em meu ativismo [ambiental]. Isso me mantinha pensando, inspirado, interessado, e vivo.

Mas também me fez ignorar outras coisas na vida que agora, de repente, eu percebo que eu nunca desenvolvi. Isso me deixa triste e desanimado. Eu gostava de cozinhar, mas parei. Eu sempre gostei de crianças, mas nunca pensei em ter filhos. Mudar o mundo era mais importante e ter um filho iria interferir com o trabalho de nossa vida de mudar o mundo.

Eu não desenvolvi minha mente de uma forma ampla, por exemplo, aprendendo sobre música, arte, teatro, poesia. Fiquei sempre focado em mudar o mundo. Eu realmente nunca pensei sobre a carreira – eu estava vivendo minha vida, não me preocupando com as armadilhas e as credenciais do chato mundo do status quo.

Talvez eu estivesse vivendo em uma bolha de ingenuidade, fazendo minhas próprias coisas, sem me preocupar se as minhas perspectivas e ações eram tão diferentes do “normal”. De qualquer maneira eu nunca quis ser normal. “Normal” nos levou a essa bagunça na qual estamos todos metidos.

Então agora eu me encontro quebrado em pedaços … Talvez eu tenha torrado minhas glândulas suprarrenais. Talvez meu cérebro tenha se envenenado de tanto pensar sobre as trágicas questões ecológicas… E de ficar frustrado com o progresso lento das melhorias [em contraste com] a rápida destruição do mundo vivo…

Eu deveria ter desenvolvido um relacionamento mais profundo com a minha família e com as pessoas. Não me interpretem mal – eu tinha muitos amigos e conhecidos no mundo ativista. Mas eles não eram amigos do coração. Eu negligencei o meu coração e meus sentimentos sobre as coisas, sobre as pessoas, sobre as situações. Agora que estou em crise, eu realmente não tenho palavras para me conectar com as pessoas. O silêncio é mais fácil do que tentar explicar o que eu estou passando ou do que tentar me relacionar com as questões e problemas das outras pessoas.

Então que conselho eu posso oferecer? Seja equilibrado. Faça ativismo, mas não exagere. Se você superestressar ou cair em depressão, você não será legal para ninguém, muito menos para você mesmo. Quando você está neste estado, não há nada que pareça valer a pena nem tampouco razões para ir em frente.

É honroso trabalhar para mudar o mundo, mas faça isso de forma equilibrada Cultive mais outras coisas que você gosta de fazer e você vai ter mais energia e entusiasmado com o ativismo. Não negligencie passatempos ou prazeres. Lembre-se de caminhar e dançar e cantar. Manter o seu espírito vivo e saudável é fundamental se quiser continuar.

Eu nunca entendi muito bem o que era o burnout [‘apagão’, termo em inglês para designar o colapso que ocorre pelo stress exagerado]. Eu sabia que isso afeta mesmo pessoas ativas, mas, de alguma forma, eu pensei ser imune a isso… Mas no final, quando o burnout me alcançou, foi mega, e deve ter sido o acúmulo de décadas de tensão e negação. Agora eu me encontro em um labirinto escuro e confuso tentando vislumbrar o caminho de volta à sanidade e calma.

Então, cuidado!

Leve meu aviso a sério. Se você começar a escorregar para dentro do buraco da depressão, se perceber que está perdendo o entusiasmo e tornando-se profundamente desencantado, faça uma pausa e procure conversar com um amigo.

Não ignore isso. O mundo precisa de todas as pessoas que se motivam a lutar por diferentes causas. Se você puder ficar na luta por longo prazo, você pode fazer uma contribuição real positiva e viver para testemunhar a próxima vitória!”

ativistas

Rede de Informações Anarquistas – R.I.A

(Angola) Presos políticos iniciam greve de fome em Angola

Em Junangolaho, foram presos em Luanda 15 ativistas cívicos. Os jovens estavam reunidos numa residência particular com o objectivo de lerem e discutirem um livro sobre técnicas de ação não violenta visando a substituição de regimes ditatoriais.

Alguns destes ativistas tornaram-se conhecidos nos últimos anos ao darem o rosto, em diversas manifestações, a favor da democratização e pacificação de Angola, e de um desenvolvimento social mais justo. Tais manifestações foram sempre duramente reprimidas pela polícia.

O governo angolano acusou os jovens de atentar contra a ordem pública e segurança de estado. Num discurso público, o Presidente da República, José Eduardo dos Santos veio caucionar a acusação, associando-a ao que se passara com os trágicos acontecimentos de 27 de Maio de 1977.

Pessoas detidas por tentativa de golpe de Estado são, naturalmente, presos políticos.

Pouco depois de o Tribunal Supremo ter negado o pedido de Habeas Corpus requerido pela defesa, cumpriram-se 90 dias desde a prisão dos jovens. 90 dias em solitária, em condições precárias para a sua saúde física e mental. Foi, assim, esgotado o primeiro prazo normal e o segundo excepcional de prisão preventiva, sem que a Procuradoria Geral da República comprovasse os crimes de que são indiciados.

À meia noite do dia 21 de setembro, Domingos da Cruz, Inocêncio de Brito, Luaty Beirão e Sedrick de Carvalho tomaram a decisão extrema de iniciar uma greve de fome. De acordo com a sua vontade, este protesto só terminará quando forem soltos, sendo que o estado de saúde dos ativistas é bastante preocupante. A situação é de enorme angústia para os familiares e amigos dos jovens democratas e para todas as pessoas comprometidas com a democracia e a liberdade. Dado o delicado estado de saúde de alguns deles, devido a um tratamento médico deficiente e a várias carências alimentares, uma greve de fome pode vir a representar uma ameaça às suas vidas.

Caso as autoridades não reajam atempadamente, as consequências desta greve de fome poderão ser trágicas. Silenciar é compactuar com a injustiça.

Exigimos que se façam todos os esforços para preservar a vida e a saúde de todos os presos políticos. Exigimos que se quebre o silêncio. Exigimos Liberdade e respeito pelos Direitos Humanos em Angola.

Exigimos Justiça.

A situação é urgente. Nenhuma pessoa pode sentir-se livre sabendo que há, algures, outras pessoas presas por sonharem com um mundo mais justo. Nós partilhamos desse mesmo sonho que levou os jovens à cadeia, o mesmo sonho que agora pode custar-lhes a vida.

Liberdade já!

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DROGAS, PRAZER, LIBERDADE & ANARQUISMO[1].

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Se eu quiser fumar, eu fumo / Se eu quiser beber, eu bebo / Eu pago tudo que eu consumo / Com o suor do meu emprego / Confusão eu não arrumo / Mas também não peço arrego / Eu um dia me aprumo / Pois tenho fé no meu apegoManeiras – Zeca Pagodinho.

  1. Vida e Intensidade das Drogas: um depoimento pessoal de um anarquista.

Escrever esse texto foi mais difícil que fazer a palestra com o mesmo titulo no Núcleo de estudos Libertários Carlo Aldegheri (Guarujá – 28/9/13)[2]. Em uma palestra temos menos pessoas e as bobagens, mesmo gravadas, tem uma repercussão menor.

Contudo, há tempos que desejo questionar algo que está muito difundido em nosso meio, a ideia de que fazer o uso de varias substancias químicas é expressão de uma determinada forma de liberdade. Para alguns é a própria expressão do anarquismo, outros mais ingênuos acreditam que esse uso é uma forma de contestação da ordem.

Tais reflexões são resultados dos meus 49 anos de existência, sendo 20 desses como usuário dos mais diferentes tipos de drogas, além, de uma longa busca de entendimento sobre as causas que me levaram a esse comportamento. Busca essa que sempre acompanhou minha diferente forma de viver, porém, que se torna mais critica, a partir de 1993, quando escrevi meu primeiro projeto pedagógico de pesquisa sobre o tema, para o CEFAM (Centro de formação do magistério), e em 1995 para o centro de Convivência (PUC/SP). No entanto, a reflexão se aprofunda quando assumi a perda de controle sobre minha própria vida, e fui para um grupo de autoajuda em 1998, portanto, sou um dependente químico em recuperação e tento ser um estudioso sobre o tema. Meu pai era alcoólatra e com o desenvolvimento da doença se tornou uma pessoa bastante violenta, assim, somada a experiência familiar meu tempo de contato com essa situação é maior.

Infelizmente, em nosso meio alguns tem muita pressa em tomar uma posição sem conhecer o todo, limitando-se a análise das partes, assim, sugiro que leiam o texto todo e mantenham a mente aberta. Outra característica comum, é que aqueles que se posicionam e desagradam são execrados, viram traidores ou inimigos mortais. Entendo essa limitação ética, solidaria e intelectual dos que julgam, não gostaria de ser um desses excluídos, mas se assim for, que seja. Nunca quis ser ou fazer parte da maioria. Essa é uma das mais fortes razões desse texto ser tão difícil!

 

2.Essas ideias ja foram questionadas

As divergências entre libertários tem que ser cordiais. Cada militante deve ter a sua própria personalidade, apresentar os problemas como melhor interpretar, mas disposto sempre acorrigir erros e retificar sempre que se demonstrar o equivoco e afalta de razão. O não compartilhar da opinião dos demais, não estar de acordo com fulano ou beltrano não justificas tirar o corpo e não contribuir com aparte que lhe corresponde na hora de meter o ombro na obra comum” (Fragua Social, nº 24, out./1980 de Jose Hiraldo).

Durante a palestra citada, um companheiro que muito estimo disse que minha fala parecia com a dos militantes do século passado que faziam campanha contra as bebidas alcoolicas, respondi que de certa forma sim. Eu, talvez mais que muitos, posso por exeperiência pessoal, falar dos malefícios que o uso abusivo e indevido de varias substâncias químicas podem causar. Tambem reafirmei que não estava ali falando contra ninguem ou nenhuma substancia quimica em particular. Compreendo que dentro das garrafas de bebida alcoolica não vem violência, a violência está no indivíduo que a usa, e que por razões de sua historia pessoal ou contexto se torna violento. Ademais, o dono do bar, da padaria, da farmácia, em muitos casos, dependendo do contexto, são tão traficantes quanto aqueles que ficam escondidos, nas quebradas da vida, vendendo sem marketing e a “proteção” da policia, seus “bagulhos”.

Uma garota que fez parte da Marcha da Maconha no litoral paulista disse que minha fala era igual a da Globo, fiquei com uma vontade enorme de rasgar o verbo, mas isso tudo é tão desnecessário, não estava lá para brigar com ninguém. Inclusive quem acredita nos efeitos benéficos da maconha, coisa que em parte posso até não dicordar, afinal, pesquisas demonstram que o uso medicinal da maconha para doentes crônicos tráz vários benefícios, que uma taça de vinho ou um copo de cerveja não são de todo prejudiciais, mas, será que isso se aplica para todos os que estão agora experimentando, ou os que fazem o uso diário?

Ninguém, absolutamente ninguém nasce sabendo quem será ou não um dependente quimico. Mesmo os filhos de dependentes quimicos que tem uma diferença genética que os torna mais suscetiveis não estão obrigatoriamente fadados a serem portadores dessa doença chamado álcoolismo ou “adicção”[3], depende de outros fatores e do contexto de suas vidas. Como saber quem se tornará um doente? O que nos leva a ficar doente? Penso sempre na brincadeira da roleta russa, um revolver, seis espaços, uma bala, puxa o gatilho, pode não ser na primeira, talvez nem na segunda, mas em algum momento, BUM! Nos tornamos um dependete quimico, um doente.

Curioso faço uso de diferentes substâncias desde 1980, e as músicas consideradas de contestação e que fazem apologia das drogas, como as de Raul Seixas, ou do grupo de RapDe menos crime”, com a musica “Fogo na bomba”, Racionais MC, em varias de suas músicas, Marcelo D2 em outras, exaltam a maconha, mas ao mesmo tempo, alertam “cuidado que ela pode te dominar!”, “voce tem de fazer a cabeça não ela te fazer a cabeça”.

Mesmo os que acreditam no carater benéfico dessas substâncias deveriam ter em mente que nenhum ser humano é igual a outro e que aquilo que não me faz mal talvez faça para outra pessoa, assim associado a toda luta pela discriminalização ou liberação deveria estar tambem a luta pelos esclarecimenos necessários quanto aos possíveis prejuízos que podem trazer a muitos.

Quanto a minha fala ser semelhante a da Globo, mais que isso o importante são meus atos. Moro no extremo da Zona Leste, PQ S. Rafael, distrito de São Matheus, minha casa fica em frente a um córrego poluído e fétido. Logo depois uma favela, hoje urbanizada, que existe há tanto tempo, ou mais que eu de vida. Trabalho em uma escola estadual que fica encravada no meio de outra favela próxima de casa; há tempos tive condições de sair desse lugar, de trabalhar em uma escola melhor localizada, mas….. fiz uma opção na vida. Ficar entre aqueles com que me identifico, viver onde minha familia viveu, colocar meus parcos recursos a sua disposição, a disposição de uma causa.

 

3. Algumas considerações sobre o tema drogas

Droga é toda substância química que, introduzida no organismo, provoca alterações no sistema nervoso central. Há vários tipos de drogas e aqui não nos interessa se são lícitas ou ilícitas. As características do indivíduo, a qualidade da droga, a expectativa sobre seus possíveis efeitos e as circunstâncias em que ocorre o consumo implicam situações diferentes. Por isso que é importante ressaltar que, para ser mais bem compreendido, o tema drogas precisa ser abordado considerando-se três fatores: o indivíduo, o produto e o contexto sociocultural. Há sempre um indivíduo que tem acesso a um produto em um contexto sociocultural qualquer.

Realmente existe prazer no uso de drogas. O problema está na memória, que, com o tempo, vai nos traindo, até chegarmos a uma doença incurável, que afeta o físico, o mental. Não negamos o prazer que se obtém com o uso de drogas, porém, o consideramos imediatista, e o preço a ser pago por ele extremamente alto.

Fala-se em predisposição do indivíduo, que seria determinada por sua história familiar e individual; porém, é necessário levar em conta o efeito atrativo do prazer e o significado que ele assume no universo do indivíduo, ou seja, o espaço que preenche e as expectativas que atende.

A tolerância se estabelece lentamente; o organismo permanece sensível ao excesso de droga. Isso significa que o uso repetido de determinada droga faz com que seja necessário usar doses cada vez maiores para obter os mesmos efeitos experimentados.

Nem todos fazem uso abusivo das drogas. Há os experimentadores, que se limita a poucas vezes; aqueles que fazem uso recreativo ocasional, isto é, indivíduos que utilizam um ou vários produtos de maneira esporádica; aqueles que fazem uso habitual ou funcional, ou seja, aqueles que reiteram o uso do produto, o qual, embora controlado, já ocasiona ruptura escolar, profissional, familiar e afetiva, mesmo quando a integração social (funcional) é preservada. O dependente disfuncional (toxicomaníaco) é aquele que estabelece uma relação de exclusividade com a droga, quando ela passa a dominar toda a sua vida e o torna um dependente químico.

Algumas das motivações podem ser: a curiosidade, qualidade natural do ser humano; os grupos ou movimentos culturais, em virtude da identificação com determinados modelos de comportamento; a fome, a falta de perspectivas, as dificuldades de relacionamento, a saúde, as dificuldades de acesso à informação e à formação cultural; a já citada busca do prazer imediato/intenso, ou seja, o desejo de chegar ao êxtase sem esforço da consciência.

A questão é que a memória registra o primeiro prazer. O uso contínuo é a busca da repetição desse prazer, que ficou registrado na memória, mas que não ocorrerá mais da mesma forma. A partir daí, vai-se desenvolvendo a doença.

A dependência não se dá somente em relação às drogas, mas também em relação às pessoas, aos objetos, às situações etc. e pode ser física (adaptação do organismo ao uso de determinada droga) ou psicológica (impulso para continuar usando a droga, [compulsão], para reexperimentar o prazer). Apesar de incurável, essa doença tem um tratamento, que pressupõe total abstinência das drogas e mudança radical na qualidade de vida.

Entre outros aspectos do processo de recuperação cito, como sugerem nos grupos de auto ajuda “abandonar as velhas companhias e os velhos lugares” esses estão muito associado a nossa vida durante o consumo dessas substancias, dentro do possível “reparar os erros que cometemos”, etc.

4.Nosso passado mais distante

Pensemos. Como na virada pro seculo XX os jovens do passado tinham contato ou chegavam ao anarquismo? Pelo que vemos na literatura e nos relatos que nos contaram os companheiros (as) mais velhos (as), eles chegavam pela familia que os levava ou através das juventudes libertárias que eram espaços de organização dos jovens.

Muitos desses pais e mães eram os mesmos homens e mulheres que faziam a campanha contra o tabaco ou as bebidas alcoólicas, por outro lado, ainda que se tomasse um copo de vinho isso não era fora de um contexto social, ou antes, das refeições. Com certeza havia os “borrachon”, dependentes das bebidas alcoólicas e até de outras substâncias no meio anarquista, mas o contexto, as relações interpessoais e a forma de organização devia proporcionar uma forma mais proterora e coerente de lidar com o problema.

Lembremos que no Brasil durante muito tempo uma das parcelas mais expressivas do movimento libertário era de cunho anarcosindicalista, contra esses a repressão estatal das várias ditaduras foi mais intensa. Sem contar os diversos outros problemas que o movimento enfrentou e que contribuiu para que o movimento perdesse muito da combatividade das décadas anteriores.

 

4.1.Década de 1960: É proibido proibir!

Posso estar falando uma besteira gigantesca, mas em nosso caso particular, acredito que começa a ocorrer uma mudança significativa na década de 1960 com os movimentos de contra-cultura, a agitação dos estudantes e trabalhadores franceses, a resistência a guerra do Vietnã, o movimento hippie. Com isso inauguram uma nova e forte onda de resistência a ordem estabelecida, no bojo dessa situação ocorrem outras mudanças tambem de contestação à forma de organização familiar, aos papeis pré-estabelecidos entre homens e mulheres, à educação reprodutora do status quo, a forma de produção em massa e a destruição do meio ambiente, as inúmeras ditaduras na America Latina, Central, etc.

Entre outras coisas os movimentos de contra-cultura trazem a experiementação de várias substâncias como forma de contestaçã da ordem. Como exemplo podemos citar os integrantes da banda The Doors, principalmente seu vocalista – Jim Morrisson, que usavam essas substancias para “abrir as portas da percepção”. Muitas foram as figuras de grande expressão na musica, literatura, cinema etc que morream de overdose “meus heróis morreram de overdose, meus inimigos estão no poder” Cazuza.

Uma das frases e palavras de ordem mais emblemáticas do periodo foi “É PROIBIDO PROIBIR”, para muitos tinha relação com a censura que era intensa, hábitos e costumes arcaicos e ultrapassados que tudo proibia. Para outros com a crença de que nada podia ser proibido, e consequentemente tudo devia ser liberado, até aí tudo bem, cértissimo, nada deveria ser pura e simplesmente proibido. Nesse momento, para muitos, teve inicio o uso de várias substâncias químicas para experimentação que a muitos levará à doença, loucura ou morte, ouso dizer que a proporção dos que se recuperam, ou conseguem ter uma vida saudável após esse período é menor daqueles que continuam sofrendo. Entre muitos dos legados recebidos tão positivos, esse é um dos negativos.

4.2.Década de 1980 e o ressurgir do anarquismo

Existe uma literatura e historiografia comprometida com seus interesses de classe social ou politica, entre outros, os marxistas que tentaram fazer crer, que o anarquismo desapareceu. Contudo, pela convivencia com os militantes mais velhos, e inúmeras pesquisas sabemos que isso é uma mentira. Evidente que o anarquismo perdeu parte da força que tinha no passado, mas sempre se manteve vigilante, firme e forte nas brechas dessa sociedade.

Ressurge de forma pública na década de 80 com os companheiros do Centro de Documentação e Pesquisa Anarquista, e o jornal Inimigos do Rei na Bahia, do Grupo Anarquista Jóse Oiticica no RJ, em SP com o Centro de Cultura Social, reaberto no Brás em 1985, assim como outros em muitos lugares.

No CCS estavam nossos companheiros mais experientes, a geração que sobreviveu às ditaduras, hoje muitos falecidos, entre eles muitos espanhois que lutaram na guerra civil e portugueses que resitiram a ditadura salazarista, a esses se somaram trabalhadores e estudantes e professores universitários.

Mas, uma característica marcante desse momento é um enorme hiato geracional, uma diferença de idade que em muitos casos ultrapassava 30 anos. Quando cheguei ao CCS ainda participava do movimento punk, era estudante secundarista e metalúrgico tinha 20 anos e era um dos mais jovens, o que vinha logo após, tinha 20 anos a mais e os demais mais de 30.

Nós da década de 1980 começamos (ou demos continuidade) a um ciclo em que os jovens se iniciam cada vez mais cedo no mundo das experimentações das diferentes substâncias quimícas, geralmente primeiro em nossas casas nas festas familiares, ou com nossos pais. Quem não se recorda da cena? A “criança olhando para o copo de cerveja, vinho ou até caipirinha de alguém, e o outro diz, molha a chupeta no copo para ela não ficar com vontade; ela pode ficar doente, ter lombriga”. Era comum, habitual o uso doméstico de bebidas alcoólicas entre outras substâncias, e que depois se estendia para o uso com os colegas de escola ou de outros espaços, nos movimentos culturais juvenis com quem convivemos e onde os nossos modelos de pessoas eram outros igualmente doentes, muitos desses tambem ja falecidos de overdose.

Ainda que estudasse muito, diversos aspectos da vida como um todo e do anarquismo de forma geral, mantinha uma relação duvidosa e desafiadora em relação à sabedoria desses companheiros, no que diz respeito, a varios aspectos e tambem ao consumo das diferentes substâncias, das quais fazia uso, e negava os efeitos prejuciais. A NEGAÇÃO é a mais forte característica do dependente quimico, e, não por acaso, os grupos de autoajuda mais antigos e com melhores resultados Alcóolicos Anônimos e Narcóticos Anônimos, propõem no seu programa de recuperação, que o primeiro passo do doente “é admitir que perdeu o controle sobre sua vida”.

Enfim, éramos nós, a caminho da adicção, assumindo a militância ao lado daqueles que no passado faziam as tais campanhas preventivas em relação às várias substâncias quimícas que podem trazer prejuizo a vida pessoal, familiar, politica e social do indivíduo. Esse hiato nunca foi uma disputa geracional explícita, mas com certeza havia muita desconfiança em relação a nossa geração. Valorizávamos a nossa própria experiência e negávamos a experiência dos outros, que estavam marcadas pela história de vida desses militantes além dos registros da historiografia e literatura.

Durante meus anos de CCS, convivendo com homens sábios e gentis, uma única vez, ouvi o Jaime Cubero, secretario do Centro de Cultura Social fazer um comentário pouco elogioso ao uso de substâncias químicas; certa feita bebendo cerveja em um grupo junto com o Chico Cubero, percebendo a velocidade com que eu sorvia a cerveja, ele me disse: “voce não acha que bebe demais?”

Certa vez, encontrei o professor Mauricio Tragtenberg perto da PUC onde lecionava, próximo de onde morava, e, conversando sobre a maconha, me disse: “não vejo graça, fumar e depois ficar de boca aberta ‘moscando’”. Se eles insistissem – Jaime e Chico Cubero e Maurício Tragtenberg –, só nos afastariamos, pois éramos – eu em particular – a própria negação em pessoa. Hoje, muitos de nós mais maduros, estamos dispostos a abordar e conversar sobre esse tema com um companheiro, um colega ou um familiar? Estamos preparados?

5. ANARQUISMO: a mais alta expressão da ordem!

Elisée Reclus afirma que o anarquismo é a mais alta expressão da ordem, pois, é a ordem livremente construída de baixo para cima e aceita por todos os envolvidos, mas, para o adícto esse tema, essa ordem existe na teoria, no campo do conhecimento e não na prática.

Jaime Cubero definiu como ideias força o queoutros definem como princípios anarquistas: liberdade/autonomia, organização do simples para o composto / federalismo (rede), auto­gestão, apoio mútuo e solidariedade; ideias-força que deveriam orientar as ações dos anarquistas em toda sua vida.

Para Daniel Guérin “não me torno livre se­não pela liberdade dos outros… A pessoa só realiza a liberdade individual desde que se complete com todos os indivíduos que o envolvem e somente graças ao trabalho e ao poder coletivo da sociedade”. Tal liberdade traz em si outro componente igualmente valioso que é a responsabilidade pelos seus atos, afinal como pessoa livre devo antes de qualquer coisa responder primeiro a minha propria consciência e depois a sociedade libertaria. Nessa direção Maurice Joyeux afirma que essa liberdade “(…) é o princípio que consubstância um dos ma­is altos valores humanos é inconcebível sem a igualdade econômica”.

O adicto por sua obssessão e compulsão reconhece a liberdade, mas não a vivência de forma responsável, senão o que dizer das suas falhas de carater, quando não é responsavel pelo seu dinheiro, pela sua vida? Como justificar isso aos seus companheiros de grupo, a sua familia, esposa, filhos e amigos, quando não age de forma coerente com o que defende.

O federalismo (REDE) deve ser visto como uma estrutura que cresce de baixo para cima, partindo do simples para o composto, da associação dos trabalhadores de uma empresa ou moradores, de uma região para outra e depois para a cidade, etc. A uma organização fundada na violência e no princípio da autoridade instituída: o ESTADO. Frente a essa instituição devemos opor associações fundadas na auto-organização das pessoas e dos grupos sociais, em âmbito do bairro, cidade, estado, nacão, etc. É o indivíduo livre que se associa com outros igualmente livres para gerir todos os assuntos que lhes dizem respeito.

O adícto estará mais (associado) federado, com seus companheiros de consumo, aqueles com quem convive com mais frequência para fazer o seu uso frequente. Como uma verdadeira federação, ele se encontrará com outros depedentes quimicos em qualquer lugar por onde andar, também nesse caso, os grupos de autoajuda sugerem como um dos seus passos “evitar os velhos caminhos e as velhas companhias”.

Para Joyeux autogestão não é uma estrutura no seio da qual se elabora uma experiência socialista, ela é o fruto de uma experiência socialista que resulta da ruptura revolucionária. É quando se produz essa ruptura que in­tervém a autogestão, simultaneamente como autogestão das lutas e da economia (ou o que restar dela).

Como um adícto pode autogerir sua vida sendo dependente de substâncias quimicas, de pessoas como o traficante ou de lugares onde geralmente consuma ou de objetos que fazem parte de seus rituais de uso?

É importante ressaltar que os libertários reconhecem a necessidade da adoção de regras em toda a sociedade; não pode existir autogestão sem regras. A consideração importante não é tanto se devem existir regras, e sim, sobretudo, o modo como as regras serão criadas, os processos determinarão sua extensão.

Ainda que o adicto possa durante boa parte de sua vida ser um ser social produtivo e atuante nessa sociedade idealizada, quanto tempo levará para que ele se torne, pela sua condição de doente, um peso no futuro? È justo e aceitavel que a sua liberdade vivenciada de forma tão irresponsável o torne um fardo para os demais?

De acordo com Errico Malatesta, essa forma de organização da sociedade pretendida pelos anarquistas “(…) outra coisa não é senão a prática da cooperação e da solidariedade, condição natural, necessária, da vida social, fato inelutá­vel que se impõe a todos tanto na sociedade humana quanto em todo grupo de pessoas que tenham um objetivo comum a alcançar”.

Com sua forma específica de organização e a aplicação desses princípios, os anarquistas desejam abolir de forma radical a dominação e a exploração do homem pelo homem. Querem os homens, unidos fraternalmente por uma solidariedade consciente, que cooperem de modo voluntário com o bem estar de todos, que essa sociedade seja constituída com o objetivo de fornecer a todos os meios de alcançar igual bem estar possível, o maior desenvolvimento possível moral e material.

O adicto é solidário e cooperativo até o momento que isso não dificulte seu desejo de consumir, não atrapalhe seus momentos e rituais de consumo. Quando isso acontecer ele se verá em uma situação que tanto poderá optar por continuar se enganando nessa zona de conforto quanto confrontando seu problema, buscando ajuda e descobrindo sua doença, incurável, mas tratável.

Os anaquistas estimam ser necessário que os meios de produção estejam à disposição de todos e que nenhuma pessoa ou grupo de pessoas, possa obrigar outros a obedecerem a sua vontade, nem exercer sua influência de outra forma senão pela ar­gumentação e pelo exemplo. Que exemplo damos quando não temos o controle sobre nossas próprias vidas? Quando muitas vezes nos engamos dizendo “eu uso, mas paro quando quiser, tenho controle sobre minha vida, não sou viciado?”, mas, na prática ja não vivo sem usar.

Como o adícto pode estar pronto para a ação direta – que é democrática, pois cria espaços públicos em que cada um é um e você não delega a ninguém, por isso os anarquistas são contra o voto obrigatorio nas eleições, defendem a auto-representação, cada cidadão é cidadão de si mesmo – se muitas vezes ele esta presente com a mente ausente, na pratica delegando a outros lutarem por ele?

Para os anarquistas é necessário proceder imediatamente e como se puder à expropriação dos capitalistas; ocupa­ção das fábricas, das terras, dos bancos, meios de transporte pelos trabalhadores. Inventário de todos os bens de consumo disponíveis e organização da produção e da distribuição através dos sindicatos, das cooperativas, das câmaras de trabalho, dos grupos de voluntários e de todos os tipos de associações existentes ou que se constituirão para responder as ne­cessidades imediatas. A autogestão.

É uma necessidade imediata lutar para poder consumir? Consumir algo sem o que vivemos bem? Quando em particular entramos nessa ciranda de consumo nos diferenciamos dos playboys,que criticamos por irem ao shopping gastar com roupas e calçados caros? Como dizemos, roupas de grife famosas? Quando comprometidos com um grupo de militantes, colegas de um time de futebol ou uma familias e escondemos parte ou a totalidade do dinheiro que recebemos pelo nosso trabalho para nosso consumo dessas substâncias quimícas estamos de fato sendo éticos?

Em uma sociedasde libertária o uso, seja lá do que for, deverá ser livre, mas, será igualmente estimulado por todo tipo de propaganda? Não nos dedicaremos a estudar esse e outros aspectos de nossas vidas, para nos orientar e divulgar o resultado de nossas pesquisas, alertando para os malefícios que substâncias, alimentos, prática de vida, etc, que podertão causar danos em nossa vida em sociedade?

Enfim, com as tecnologias disponíveis seria possível realizar assembléias, mesmo que por respresentação, onde todos poderiam acompanhar os debates, e até intervir nas votações através das redes de computadores hoje disponiveis. Fazer reuniões e assembléias de bairro, cidades, intercidades, por regiões, naciona­is, internacionais que tomariam as iniciativas necessárias, em concordância com as dos outros, e que as realizariam sem pretender fazer a lei para todos, nem as impor pela força aos reticentes.

6.Prazer e doença.

É evidente que alguns consumirão seus baseados ou suas cervejas, vinhos e outras bebidas, seus “remédios” sem prescrição médica, etc, durante toda a vida e não terão problemas, serão pais e mães responsáveis, militantes comprometidos, mas, podem garantir que se tiverem problemas conseguirão superar a negação? Procurarão ajuda? Sabem onde procurar?

Não posso negar o “prazer” que desfrutei durante certo tempo de minha experiência, contudo, com o consumo cada vez mais compulsivo e obssessivo fui perdendo o controle e comprometendo, a minha qualidade de vida, bem como daqueles que mais amo.

As drogas proporcionam prazer? Sem sombra de duvidas! Afinal temos uma dor de dente e tomamos uma droga para aliviá-la. Era prazeroso beber uma cerveja, mas o que dizer de uma dezena ou mais? Desde a adolescência tenho insônia e nada mais prazeroso que fumar um baseado para dormir bem, mas e quando não o temos, não teremos insônia do mesmo jeito? E quando, além da hora de dormir, fumamos durante todos os momentos do dia? E quando nosso último pensamento antes de dormir é “fumar um”, e ao acordar é fumar outro? Isso para ficar nas drogas, cuja dependência se estabelece mais lentamente, existem outras cuja dependencia é mais rapida e intensa, nos torna doentes mais rapidamente, com um comprometimento pessoal quase que total. Existe sim o prazer, mas nesse caso, o preço pago por ele é alto demais e imediatista.

Ação preventiva

Estarão os companheiros atuais e futuros, usuários das mais diferentes substâncias químicas, em condições de reconhecer sua lenta e paulatina perda de controle? Do desenvolvimento dessa doença chamada alcoolismo e adicção? Aqueles que hoje dizem não ter esses tipos de problemas podem afirmar, sem nenhuma sombra de dúvidas, que não os terão?

Os que são usuários, e acreditam ter esse controle, conseguem reconhecer que isso pode, ou está, acontecendo em qualquer lugar, inclusive, na sua casa, no seu local de estudo, trabalho, cultura e lazer?

Estamos prontos a exercer de forma responsavel e solidária nossa liberdade, no sentido de conversar com esses companheiros, amigos e familiares, convidando-os a perceber o quanto que comprometem suas vidas? O quanto eles e nós perdemos em nossas vidas com suas escolhas? O quanto isso é um projeto de MORTE e o ANARQUISMO propõe um projeto de VIDA?

Somos cooperativos o suficiente em apoiá-los para que sintam a confiança necessária, e novamente assumirem o controle de suas vidas? Para autogerirem suas vidas de forma autonôma, responsável, solidária, cooperativa na obra comum que nos propomos realizar?

Que se libere o consumo de todo tipo de substancias quimicas. Muitos argumentam que morrerão muitas pessoas! Não morrem hoje? A proibição é um fenomeno politico e cultural. Em outras epoca e contextos o que hoje esta proibido ja foi liberdado, vemos pelo mundo experiencias de discriminalização, liberação e ate de legalidade. Mas sempre tenhamos a coragem de assumir uma posição de questionamento em relação a tudo, inclusive ao nosso exercicio da liberdade.

Continuo tendo amigos e colegas que são usuários contumazes e muito os respeito, mas, “quem quiser julgar que julgue, quem quiser criticar que critique”, (qualquer semelhança com Zeca Pagodinho não é mera coincidencia), posso falar por experiência que, no meu caso não deu certo. Convivi, e convivo, na condição de educador, ser politico e social, morador da periferia com essa experiencia que para muitos continua não dando certo.

Às vezes, acho que hoje ser careta é ser revolucionário, pois são muitas as desculpas e estímulos que nos levam a experimentação e ao uso abusivo e indevido dos mais diferentes tipos e substâncias químicas.

Antono Carlos de Oliveira (Professor Coordenador Pedagogico da EE prof Isaac Shraiber – Março de 2014)

[1] No processo de construção desse texto dois companheiros e amigos foram imprescindíveis, Jose Damiro Moraes Professor Doutor em Educação e Edvaldo Vieira da Silva Doutor em Ciências Sociais, ainda assim todas as ideias aqui apresentadas são de minha única e exclusiva responsabilidade.

[2] Agradeço imensamente aos companheiros do NELCA por abrirem o espaço para essa discussão, não é um ponto de vista muito comum e ainda que seja de minha responsabilidade tudo que exponha eles são os responsáveis pelo espaço e sua programação.

[3] Adicto é a forma como é tratado o usuário de vários tipos de substancias químicas diferentes, uso por ser o mais comum, mas é tema controverso, afinal o alcoólatra que é tabagista não faz uso de duas substancias químicas diferentes? Muitos alcóolatras em recuperação não aceitam tal definição.