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(Estados Unidos) Relato de anarquistas de Pittsburgh sobre os confrontos no Comício de Trump

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Tradução pela Agência de Notícias Anarquistas-ANA

No dia 13 de abril, anarquistas de Pittsburgh participaram de um ataque a um comício da campanha de Donald Trump. Essa é uma mensagem de alguns dos organizadores desse contingente anarquista, trazendo reflexões sobre nossa atual situação.

No dia 11 de abril, a campanha de Trump anunciou planos para dois eventos num mesmo dia, em bairros diferentes de Pittsburgh. No início do dia, ele participaria de um town hall com Sean Hannity em Oakland, um bairro universitário da cidade, e à noite iria realizar um grande comício no centro da cidade. Quase imediatamente, diferentes setores da Esquerda lançaram chamadas para ações e começaram a planejar manifestações. Pouco depois, vieram as tão comuns ameaças da Direita de confronto armado com os manifestantes.

Ações contra o evento de Trump em Oakland foram convocadas por vários grupos ativistas estudantis no campus da Universidade de Pittsburgh, bem como pelo WHAT’S UP?!, um grupo local anti-racismo. O ANSWER, uma frente da seção de Pittsburgh do Partido pelo Socialismo e a Liberação, lançou um chamado para uma reunião e para a marcha ao evento principal da campanha de Trump no centro da cidade.

Anarquistas e antifascistas autônomos sabíamos desde o início que nosso objetivo principal era a perturbação total e o confronto tanto com Trump quanto com seus apoiadores. Nós sentimos que as organizações estabelecidas, como o WHATS UP?! e o ANSWER, poderiam ambas trabalhar para atrapalhar esse objetivo em favor de suas próprias visões do que consistiria numa ação anti-racista bem sucedida. Nós escolhemos organizar nosso contingente de um modo que maximizasse nossa autonomia e nosso controle de nossas ações e desejos.

As ações contra os eventos de Trump começaram no início da tarde em diferentes partes da cidade, mas, para os propósitos deste texto, focaremos nos eventos relacionados ao comício principal de sua campanha, no centro de Pittsburgh. Nós escolhemos esse foco porque foi aqui que se situaram as energias principais da organização antiautoritária, e também porque nós sentimos que ele oferece um roteiro para a luta contra a supremacia branca da Direita.

A aglomeração principal de anarquistas estava a algumas quadras do evento de Trump e estava programada para coincidir com a chegada de outras marchas de diferentes partes da cidade. Nós não estávamos cientes das intenções, número ou nível desejado de interferência dos outros grupos, mas imaginávamos que nossa melhor aposta era sincronizar nossa marcha para encontrar as outras aglomerações depois que já tivessem chegado ao centro de convenções. Isso nos permitiria levar uma onda de nossa energia e número, e ao mesmo tempo, fazer avançar com nossa força adentro na multidão de apoiadores de Trump para atingir nosso objetivo inicial de confrontação.

Fomos bem sucedidos com essa tática. Nosso contingente veio preparado com uma dúzia de bandeiras negras e bandeiras da Ação Antifascista, armadas sobre fortes mastros, e uma grande faixa preta. Ao chegarmos ao centro de convenções, marchamos e atravessamos uma aglomeração de apoiadores de Trump, afastamos barricadas e avançamos até a entrada principal do prédio. Muitos outros manifestantes já haviam chegado longe e estavam bloqueando as estradas; outros nos seguiam através do buraco que criamos na multidão. Quando o nosso contingente chegou à entrada, a confrontação física imedita irrompeu ao marcharmos diretamente para linha que leva para dentro do prédio. Apoiadores de Trump foram abordados, golpeados e atingidos com spray de pimenta à medida que tentávamos abrir caminho.

Durante esses combates, a polícia chegou, realizou algumas prisões aparentemente aleatórias daqueles não envolvidos nos combates e no uso dos sprays de pimenta e formou uma linha entre nós e o grupo de apoiadores de Trump. As pessoas então acenderam sinalizadores e começaram a arremessar objetos por cima da polícia na direção da linha de apoiadores, e repetidamente tentaram avançar. A esse ponto, estava claro que o comício lá dentro já havia começado e que as pessoas com as quais estávamos lutando eram aquelas presas do lado de fora, incapazes de entrar.

Após cerca de uma hora disso, o comício de Trump terminou e os presentes começaram a deixar o lugar pelas saídas. A multidão correu para as saídas, perseguindo-os, gritando com eles, empurrando-os e usando sprays de pimenta contra as pessoas enquanto saiam. As saídas foram bloqueadas e a polícia dentro do centro de convenções redirecionou os apoiadores para portas que estavam foram do nosso alcance. Apesar disso, retardatários continuaram a seguir caminho para dentro da nossa multidão e foram provocados e atacados. A polícia municipal e a polícia do condado finalmente vestiu o equipamento anti-motim e formou uma linha para limpar as ruas. Sem mais detenções, a multidão dispersou e o evento acabou.

Nossa situação:

Nós vemos o crescimento de Donald Trump como um aspecto importante da resposta direta da Direita ao movimento Black Lives Matter, à presidência de Barack Obama e àquilo eles vêem como uma ameaça existencial à supremacia branca nesse país. Essa reação da Direita tem assumido outras formas, como temos visto com o impasse armado do rancho Bundy, a ocupação do Malheur National Wildlife Refuge e o tiroteio sem vítimas fatais perpetrado por nacionalistas brancos contra manifestantes durante uma manifestação contra a violência policial em Minneapolis.

De acordo com The Atlantic, além dos marcadores demográficos de pertencimento às classes mais baixas, de branquidade e de baixo nível de escolaridade, o fator principal que une a base de Trump é o apoio ao autoritarismo e à supremacia branca. As principais questões políticas da campanha de Trump tem se enraizado na criminalização geral, detenção e expulsão de mulçumanxs, árabes, latinxs, negrxs e outrxs não-brancxs dos Estados Unidos.

O apoio a Donald Trump, e portanto também a esses objetivos, são o bastante para justificar-se como alvo de violência anti-racista.

Acreditamos que esses eventos recentes marcaram uma mudança na luta política desse país. Uma parte cada vez maior da população tem abandonado as forças políticas tradicionais em troca de “outsiders” vistos como estando nas margens, tais como Trump e Bernie Sanders. Nós vemos um desenvolvimento da demarcação entre a Esquerda e a Direita – entre aqueles que apoiam o controle corporativo de recursos, a expulsão de não-brancos e o aumento da militarização da polícia para a pacificação urbana, e aqueles que apoiam a autonomia individual, a propriedade coletiva dos recursos e a justiça racial e socioeconômica. A estrutura inerentemente bilateral do sistema americano de partidos políticos nos deixa com movimentos sociais e políticos corrompidos – a “Esquerda” deve abandonar suas tendências marxistas para adequar-se à narrativa Democrática, enquanto que a “Direita” deve se esforçar para encaixar sua ideologia supremacista branca judaico-cristã autoritária dentro do establishment Republicano.

Como pudemos ver no evento de campanha de Trump em Chicago, nas ruas de Minneapolis e no centro da cidade de Pittsburgh há algumas noites, o conflito físico entre militantes dessas duas forças – entre aqueles que querem manter a supremacia branca e aqueles que querem ver sua abolição – veio à tona e ao primeiro plano do discurso político americano. Nós vemos aqui uma oportunidade de atacar vigorosamente ambas as estruturas políticas americanas dominantes, e ao mesmo tempo contra-atacar as tendências de extrema-direita que observamos com a ascensão de Donald Trump à fama política.

Temos a esperança de que a ameaça colocada pela Direita supremacista branca, bem como o aproveitamento das oportunidades de que falamos, possam ajudar nossos movimentos a se situarem mais claramente na luta por libertação. A autodefesa combativa contra o autoritarismo pode ajudar a adquirir a autonomia individual e coletiva necessária em qualquer revolta libertadora que venha a ocorrer. Nós vemos este como um tempo para os anticapitalistas libertários aprenderem a levar a sério a ameaça colocada pela nova Direita e a dar os passos necessários para combater com força as estruturas da supremacia branca. Este não é um tempo para introspecção e auto-reflexão crítica sobre a práxis anti-racista popular, mas um tempo para a mútua autodefesa e a força coletiva contra o sistema americano de apartheid da supremacia branca.

Chegou o momento de Queimar a Colônia Americana.

De seus camaradas das colinas e vales de Pittsburgh, Pensilvânia.