Outro dia fui correr pensando na sororidade, que para quem não conhece é um conceito super ventilado nos coletivos feministas – mas pouco abordado fora – que diz respeito à irmandade/união/aliança entre as mulheres. Por óbvio, tentando digerir essa prática tão pouco comentada quanto praticada, pensamos sempre no seu oposto simétrico, o patriarcado, essa união entre homens que nos rege atualmente, cujo mal-estar é evidente. Vejam bem, mesmo entre as feministas, não existe nada pactuado, não há absoluto entre correntes que se movem, mas sim, um acordo fomentado, uma união ensejada e às vezes, pouco praticada.
Enquanto eu corria à noite, reparei na camiseta de uma adolescente “your boyfriend keeps texting me” [seu namorado vive me mandando mensagens], engraçado à primeira – e inocente – vista, mas desolador, de tão cruel. Foram poucos quilômetros e muitas lembranças, mas sempre de conversas com homens – queridos -, sobre isso, poucas conclusões e muito latim gasto nessa suposta união entre homens que a esse respeito se vangloriam. Lembrei de uma conversa na Colômbia “é que vocês mulheres adoram se degladiar” e de outros exemplos de amigas expondo outras, em situações tão corriqueiras quanto preferivelmente sigilosas.
Voltei à camisa da adolescente [fiquei pensando que mulher com mais de trinta anos faria piada disso, mas a ignorância e a juventude são atrevidas…] e pensei no significado político de afirmar uma união entre mulheres. E é justamente pra demonstrar a fragilidade dessa união patriarcal, dessa lealdade que meus queridos amigos batem no peito [até o momento em que se afastam e seus amigos se tornam esses monstros que mesmo os homens têm dificuldade de reconhecer que são], que o ensejo deve ser levado às últimas esferas.
O que o patriarcado representa, no limite, é um laço masculino que é sustentáculo do capitalismo e virtualmente dependente desse, as feministas materialistas históricas francesas nos ensinam – mas não somente elas. E o que a sororidade propõe é um giro cotidiano revolucionário na socialização feminina. Não somos nossas inimigas, não somos competidoras, nós não somente somos as netas das bruxas que vocês não puderam queimar, mas resistimos enquanto afirmamos nossa proposta distinta: viemos aqui para crescer juntas.
Corri pouco, o mal-estar era muito, me veio à mente as distintas formas em que essa proteção corporativista masculina nos prejudica e nos diminui, no trabalho, na universidade e na família. Me veio à boca a amarga sensação de enfrentar um monstro invencível, mas compartilho essa nota – tola – nessa arena de mistura privado-público, talvez por acreditar no poder de afetos revolucionários. De que todo afeto é revolucionário, que toda irmandade/laço/união é um nodo potente, rijo, capaz de vencer esse monstro, que, de tão humano, é perfeitamente vencível…
Por S.